Existem vários tipos de ignorância. Uma vez conheci um senhor que vivia no interior alentejano, e que nunca cruzára a fronteira. O seu mundo ia pouco mais além que a estrada entre o café central e o seu quintal. Ignorante e indiferente aos temas da atualidade, vivia feliz e pacífico na sua humildade e simplicidade. Relembro também momentos com familiares mais pequenos e as suas primeiras experiências com seres míticos como o Pai Natal e a Fada dos Dentes. Neste caso, era a inocência que reinava. A ignorância infantil é particularmente bela. Tem em si algo inexplicável, que vai para além da falta de experiência de vida. Promove uma pureza espiritual de dimensão divina, que invariavelmente se desvanece, como se de um perfume se tratasse.
Existe também um tipo de ignorância que me aflige particularmente, por ter um efeito nefasto de generalização sobre um grupo alargado de pessoas, nas quais eu me insiro. Falo da ignorância dos homens que odeião as mulheres. Odiar metade da população mundial com base em nada mais que a sua genitália está ao nível do analfabetismo. Não quero ser tomado por justiceiro ou defensor de causas nobres. Existe também o reverso.
Enquanto homem, deixo essa reflexão para uma mulher com coragem para se afirmar abertamente contra essa corrente igualmente triste.
Este conjunto de indivíduos, que nutre um sentimento tão profundo por biliões de pessoas que nem sabem da sua existência, leva-me a pensar o que poderá ter levado a que tal onda social se levantasse. Nós, homens, gostamos de nos sentir úteis. Temos um instinto visceral de providenciar e proteger, e ficamos sem saber muito bem o que fazer com ele quando não temos ninguém em quem concretizar esse instinto. As mulheres, atualmente, precisam muito menos de nós do que alguma vez precisaram. Isto não quer dizer que elas não nos querem por perto. Quer dizer que já não chega por pão na mesa. Isto leva-nos ao problema inverso: ela só quer o meu dinheiro. Ora se peca por excesso, ou por defeito. Por norma esta frase surge de pessoas que baseiam as suas coreografias de acasalamento no abanar dos seus leques de notas. A analogia dispensa explicações.
Para surpresa — e talvez frustração — de quem ler este desabafo que possam ler este desabafo, a grande maioria das mulheres, como quem diz pelo menos 95,44% (referência estatística a descobrir para os mais curiosos), não existem em nenhum destes universos.
Está algures no meio. São tendencialmente mais independentes, e, por isso, mais seletivas, mas o que mudou não foi o seu sentimento em relação aos homens, foram,sobretudo, os seus padrões de atração.
No mundo das aberturas fáceis, dos métodos contraceptivos, e da escolaridade obrigatória, já não chega ser o homem de antigamente. É preciso ser mais inteligente, mais flexível, mais humano. As disparidades entre os sexos nunca foram tão poucas quanto atualmente.
Caminham para serem única e exclusivamente os nossos traços dimórficos.
Aos ignorantes que odeião as mulheres pelo que elas deixaram de ser, talvez seja uma boa altura para começarem a pensar sobre o que os próprios ainda são – e o que querem vir a ser.
#TheGlitterDream